É verdade, Drummond!

VIVER NÃO DÓI

 

Definitivo, como tudo o que é simples.

Nossa dor não advém das coisas vividas,

mas das coisas que foram sonhadas e não se cumpriram.

Por que sofremos tanto por amor?

O certo seria a gente não sofrer,

apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana,

que gerou em nós um sentimento intenso

e que nos fez companhia por um tempo razoável, um tempo feliz.

Sofremos por quê?

Porque automaticamente esquecemos o que foi desfrutado e passamos

a sofrer pelas nossas projeções irrealizadas,

por todas as cidades que gostaríamos de ter conhecido ao lado do nosso

amor e não conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido

junto e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios que

gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos.

Por todos os beijos cancelados, pela eternidade.

Sofremos não porque nosso trabalho é desgastante e paga pouco,

mas por todas as horas livres que deixamos de ter para ir ao cinema,

para conversar com um amigo, para nadar, para namorar.

Sofremos não porque nossa mãe é impaciente conosco,

mas por todos os momentos em que poderíamos estar confidenciando a

ela nossas mais profundas angústias se ela estivesse interessada em

nos compreender.

 Sofremos não porque nosso time perdeu, mas pela euforia sufocada.

Sofremos não porque envelhecemos,

mas porque o futuro está sendo confiscado de nós,

impedindo assim que mil aventuras nos aconteçam,

todas aquelas com as quais sonhamos e nunca chegamos a

experimentar.

Como aliviar a dor do que não foi vivido?

A resposta é simples como um verso:

Se iludindo menos e vivendo mais!!!

A cada dia que vivo, mais me convenço de que o

desperdício da vida está no amor que não damos,

nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca,

e que, esquivando-se do sofrimento, perdemos também a felicidade.

 

(Carlos Drummond de Andrade)

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